Carne-Viva

Meus olhos estão em “carne-viva”, desfigurados.
Meu paladar se encontra apreensível, conturbado, deplorável.
Meus ossos deixam-se estar, apenas, murchar.
Causa-me fraqueza, essa luta, essa conquista irresoluta,
Esse castigo que me fascina de tamanha malícia,
Que eu acreditei, e, acredito, não haver em seu sorriso.
Meu olhar, com medo, mantêm-se escondido, de medo,
De outra inexistência de qualquer coisa, que eu acredito haver, que seja.
Meus sonhos, essa desventura que a mim tortura,
Esmaga-os, tu, com muitos cuidados especiais, com bastante perspicácia.
És belo, oh figura patética!
Fez-se o passaporte de minha tão desencantada colina, agonia, de derradeiros planos...
Enganos, incansáveis, vivos, ainda que sufocados por ti, por tua insensibilidade.
És o motivo, do choro que não escorre, dessas dores,
Que me penetra a carne com voracidades incalculáveis.
O meu tumor, maligno, que me arruína. A dor.
Representai a farsa, fora o beijo que me levou a desgraça,
Fez-se amante, tomou-me a liberdade,
A sagacidade, a volúpia, a sinceridade, que eu sonhei existir.
Tomou-me a mão, como quem embebesse de alucinações árduas,
Palpitantes, com batidas salientes em seu tenebroso coração.
Para que fizestes de tudo aquilo?
Não sabe como... Mal sabe como... Olho para ti,
Com os mesmos olhos, como quem ainda lhe espera,
E lhe entrega toda a minha vã paixão,
Como quem não sabe cessar de lhe querer,
E de alimentar, razões supostas por seu abandono, esse desencontro...
De te inocentar. E reavivar em mim, toda a persistência,
O ensejo de desvelar, essa ofensa, desvencilhar essa carência.
Como sou bela e patética!
Inflamo-me de insatisfações, me adorno em sedas tempestivas,
Como podes ser maus, tão cristalinos e profundos olhos castanhos?
Como podes ter a ciência dessa grotesca falência de escrúpulos?
Como, depois de toda aquela magia, nossa sintonia,
Torturar-me assim, por prazer, por não me querer?
Oh, como somos belos patéticos!
Dois espíritos despertos, prontos a lançar-se de corpo e alma,
Num amor que beneficamente, sempre acreditamos...
E terminamos por apartados, pular ponte abaixo,
E mergulhar nesse mar de insegurança e solidão...
Cavalgando semelhantes sensações,
Na ilusão do não saber,
Fantasiando monstros egocêntricos e não condizentes com o que flertamos,
Com o que semeamos para nós dois.