Arrumação

 

O calendário está bem postado naquela mesinha.
Os aniversários já estão marcados.
O porta-caneta não ficou mal ao lado dele.
E o papel amarelinho aguarda assunto para o bilhete.
As fotos ficaram bem alinhadas na velha escrivaninha.
As paredes ainda estão nuas,
mas estão sóbrias com essa cor.
Logo serão telas imensas de fantasmas e de solidão.
Os móveis grandes não podem ficar em outro lugar.
Um dia poderão ser peças de museu
ou abastecer novas lojinhas de usados.
A geladeira só tem tomada naquele lado.
Tem queijo e vinho de embriagar.
Os livros estão logo ali.
Vejo até a lombada de Graciliano,
seca e angustiada sob o cárcere.
 
Que bom! Tudo no devido lugar, assim.
Só me falta um cantinho arrumar
para as coisas que estão dentro de mim.
 
 
(Do livro Monólogo do poema ensanguentado, disponibilizado em pdf no blog https://monologodopoemaensanguentado.wordpress.com/ .)