O Vinho e a Taça

Perco-me no balcão do bar,
Acabado, recalcado, estico a mão e digo:
- Garçom, encha a taça, hoje vou me embebedar!- O que vai querer, senhor?- Qualquer coisa que me faça levitar!Ele me traz um vinho da safra de 43.
Enchida a taça, viro aquilo de uma só vez.
Estico a mão e peço mais três doses.
Ele se dispõe e enche as taças.
Viro aquilo tudo na raça,
E sinto na cabeça a loucura, a virtuose.
Faço do vinho barato, água benta,
Que inventa
De enturmar minha solidão com outras solidões;
Almas perdidas em desilusões

Que se encontram quando se perdem
E vêm juntas desfrutar a perdição enquanto bebem,
E faço de bêbados desconhecidos,
Amigos queridos.
Volto ao balcão e estico minha mão:
- Garçom, encha-me a taça,
Antes que perca a graça!
Lá vem ele de novo com o vinho de 43.
E eu torno de virar mais uma vez.
- Encha de novo, meu bom rapaz!
Quero ver do que este vinho é capaz!
- Quantas doses já tomou? Cinco ou seis?- Já nem sei!
Mas quem se importa?
A vida não é uma curva reta em reta torta
Como o fundo de uma taça
Que se estilhaça

Por um amor?
Então, por Deus e seu louvor,
Pare de pirraça,

E encha-me a taça!
Torno a virar a taça mais uma vez até o fundo,
E outros lados da minha embriaguez fecundo,
Tornando-me do alcoolismo personagem
No teatro da falsa alegria em sua miragem.
Pulo na mesa e puxo o hino da beldade,
Da boemia e da liberdade;
Meus ‘’amigos’’ captam a mensagem
E entram na ‘’viagem’’,
Brandindo taças, nossas espadas de luta
De guerras emocionais,
Que os racionais
Chamam de comer a fruta
Da perdição;
De tomar o banho da escuridão,
Mas eu lhes grito: dane-se! Hoje vou me embebedar!
E saudar
As escondidas lamentações,
Que atormentam minhas ilusões,
 
De que um dia ela vai voltar…