Da Agonia Nasce a Orquídea.

Pensado na mulher que amei,

a beira da estrada, fiquei.

 

Pior que nada

a poeira era maioral

o sangue na veia

do povo que ainda me odeia.

 

Que mal eu faria?

assim mesmo,  odiaria

falasse eu, a verdade diria.

 

o velho mestre já dizia:

verde não mais seria

as plantas, carvoaria

que falam comigo

as árvores são meus amigos

 

sendo assim,

digo a verdade,

 mesmo a poucos,

poetas são loucos

ou quase ninguém quer escutar,

poeta pode falar.

 

posso falar

ou escutar?

 

falei primeiro

a pena seria maior

se tivessem dó sem dinheiro

o mundo não poderia existir

e eu fico por aqui mesmo,

a esmo

 

já não quero mais carona.

vou voltar pra lá

volto amanhã, ou quero voltar à fonte,

do outro lado da ponte.

onde, tu sabes,

 tudo é diferente.

 

somente na cabeça da gente

o mundo muda

de lugar,

pode mudar

 

mundo à fora, 

lá fora, uma multidão

luta.

disputam a tapas

os restos do pão

no chão,

as sobras do arroz com o feijão

 

outros, o vinho

o milhão

o carro importado

 

pouco me importa,

se eles importam tudo

até os nomes dos homens

improváveis e importados coitados,

já não são os mesmos

 

 

se chorei,

dormindo chorei

porque achei que deveria chorar

com medo de acordar

 

só lamento,

nem toco,

nem canto,

nem ouço, o canto do sabiá

o canto do muro

foi meu lar,

meu altar

 

se não falasse. iria falar

nem posso cantar,

mas escrevo poesias

 

se fosse mudo,

tinha dedos,

unhas e dentes

para acenar e construir

poemas e poesias

eu faria gestos

de tudo, uma parte

de algo que contasse uma arte

 

essa arte do pensar

que abala meu coração

e arranca gotas de sangue de uma rosa flor

essa pedra bruta que é o amor

que lapidada, se faz sem dor.

 

há,

ou posso dizer que havia,

alguém que dizia

existe uma gota de sangue em cada poesia.

e assim seria.

água mole, pedra fria

o leito do rio, eu mudaria

e a orquídea nasceria, da agonia.