DESATINOS MENINOS ( conto) parte II - final

DESATINOS MENINOS  ( conto) parte II - final

Definitivamente abandonei a minha curta carreira de beato, sob os protestos injuriosos dos colegas carolas de catecismo. A eles revidava chamando-os de beija-mãos e cheira saco de padres.

O que me dava asco era a reverência de cumprimentar o sacerdote, metido como um urubu, numa batina preta, a mexer em sei-lá-o que (desconfio apenas) a agraciar-nos com os chamados santinhos, guardados nos bolsos largos, como oferendas de Deus, toda a vez que beijássemos suas suadas mãos. Ocorre que sob o sol escaldante daquelas tantas tardes de sol, a veste escura não reflete a luz, as partes íntimas do reverendo – tão humano como nós – deviam ficar em carne viva, com todos os odores daí advindos... pobres  penitentes, a minha vingança era di-vi-na !


II –  A MORTE

Quando soou a corneta em fúnebre melodia, o toque de silêncio, arrepiando a pele, todos em fila aguardando a marcha fúnebre. Foi o meu primeiro contato com a morte. Toda a escola reunida para acompanhar o cortejo até o cemitério da cidade, pela avenida central.

Uma colega de sala, no fim de semana, entrara com outras amigas em um rio e caiu em um fosso, não conseguiram salvá-la. 

Estranho alguém estar rindo, brincando feliz, e depois inerte, cheia de hematomas, morta.
O desespero do pai, aos prantos, chamando a filha ao descer do caixão na cova... a terra atirada sobre o ataúde, tão terrível impressão.

O serviço de alto-falante noticiava as notas fúnebres. Quando ouvíamos o prefixo temido, parávamos para prestar atenção... O sisudo locutor dava a notícia do falecimento de sicrano ou beltrano com rápidas considerações sobre o mesmo. Naqueles breves instantes parecia que a cidadela parava só retornando após à sua modorrenta rotina.

Só mais tarde, bem mais, novamente a água trouxe-me nova amargura, desta vez do mar, onde um amigo foi levado, sem que o corpo jamais tenha sido localizado.

Com o passar dos anos, a morte visitou-me muitas vezes, carregando entes-queridos de saudosas lembranças...

Cidade pequena, uma avenida central de extremos opostos, não apenas geograficamente falando.

Em um pólo a igreja matriz sacrossanta e no outro oposto o prostíbulo na zona rural, com suas cortesãs que escandalizavam as beatas quando adentravam no comércio em charretes de aluguel...

Nas missas domingueiras, todos os pais honrados de famílias respeitadas penitenciavam-se, aos pés da Cruz, das levianas aventuras da semana no outro lado da cidade.

Certa manhã, um corpo foi achado. Era de um senhor conhecido que vivia de pequenos expedientes,  a morte, então, já  me parecia familiar...

LEIAM A PARTE I PARA ENTENDEREM O ENREDO.