gritos em plena rua
homem nu discursa

fala gritada extenua

curiosos na anatomia
do corpo decrépito
desacreditada pantomima

e a veia saltada no pescoço
inaudíveis sons despercebidos
a estourar como caroço

turba mansa aturdida
seguindo passiva
imersa em si mesma, evasiva

e os gestos tresloucados atoleimados
nada além de um contratempo
incidente de percurso, acostumados

no curso da massa caminham
seguem unidos desconhecidos
em suas rotas distraídos

metidos enfiados em si mesmos
sufocados na pressa de chegar
a algum lugar de nome lar

onde frente à televisão
vão cochilar e acreditar
esquecer se esquecendo

postergar para depois
adiando a vida
para um amanhã talvez

fazendo contas
projetando planos
dilatando sonhos

arquitetando hoje
um futuro para além
em diálogos sussurrados

comendo fatos boatos em arrotos
falas mal digeridas desatentas
confundidos em alienados apetites

como toda rotina, despertam amanhã,
reiniciam a marcha
ilhados em si, solitários na multidão

apressados compassados compenetrados
atolados nos coletivos
aturdidos em seus caminhos e destinos

roda viva
mesquinha
feroz
nesta roda
quem roda
somos nós !

...roda a roda, rodamos nós...