SORTE

07/07/06                                                                                                                                                                                                        18:57
 
 Ontem eu estive num dia de sorte e isso custará minha paz por longos instantes de minha vida. Mas agora eu consigo olhar para o horizonte e encarar o sol cansado e que logo estará ausente.
Meu reflexo diz que uma garota linda esta para nascer a qualquer momento e eu lembro o dia que me vi dentro de seus olhos. Lembro do sorriso, os gestos, das palavras (poucas palavras) necessárias palavras. Aquele tempo era como se a realidade não existisse e os dias passavam rápido como as chuvas de outono.
Essa mesma garota já foi muito amada, muito feliz, muito intensa. E naquele dia ousamos, enquanto todos fugiam de seus destinos, enquanto os tolos deixavam seus sonhos para depois. Por um dia eu também amei, eu também fui como você: completa.
Porque deixamos as dúvidas devorarem as certezas? Porque deixamos os medos consumirem nossos desejos? Porque arriscamos uma vida inteira num espaço de tempo!
Ontem meu dia de sorte durou segundos, e todo o resto durará para sempre. Durarão lembranças inteiras, gavetas cheias e garrafas vazias.
Ela não pediu nada além de um olhar e eu sempre quis ter tudo. Ela soube ter, soube possuir. Eu deixei escapar de mansinho. Eu sou vaga, estranha, vazia.
Ela é densa, intensa, amável. Ambas moram em mim, ambas me enlouquecem.
Ambas deixaram você escapar... de uma forma ou outra.
Uma diz verdade em mentiras a outra mentira em verdades. Eu congelo.
Uma diz que somos felizes a outra recomenda libertação. Uma quer fugir a outra criar raízes.
Eu estremeço balanço, desmorono e me apoio. Vocês me confundem me fazem rir, tiram meu sono.
Uma diz que o ontem nunca existiu. A outra diz que é tudo o que tenho.
Começo a desconfiar da sorte, de mim e de tudo.

Carmen Locatelli
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