Incompetentes amorosos

Ela esteve pensando em como ele poderia ser tão irresistível dessa forma e achava aquilo fascinante. Desde sexta-feira, por causa dele, havia sido uma fantasia a mais para a conta e mais alguns dias absorvendo tudo.

No dia seguinte, ela recebeu uma mensagem e quase achou que fosse uma declaração, onde ele só dizia:

- Você é o tesão da minha vida.

Mesmo impactada sobre a possível profundidade que poderia conter naquela frase e sentindo toda a sua potência, foi comedida e limitou-se a dizer, que ele também era o tesão da vida dela.

Depois, reflexiva, sentiu por não ter conseguido responder à altura.
Ele, com apenas sete palavras, tirou todo o juízo dela num estalar de dedos. Usando muito sabiamente o recurso da ambiguidade, era uma frase com um tom poético...

Se quisessem, na verdade, haveria uma poesia inteirinha naquela frase.
Estava carregada de calor, com muitas nuances que ferviam, quase borbulhavam. Pensem bem, só pra começar, além do desejo, tem o sentido de entusiasmo, de paixão da minha vida, da-mi-nha-vi-da...

...

Daí depois ele sumiu, como de costume. Talvez surpreso com a intensidade do que poderia ter escrito e ao invés de se abrir mais, se afastou. Parecia aquele garoto que, com receio da resposta, coloca um bilhete na mochila da menina e corre.

E permaneceu assim, distante, por dias. Como as possibilidades eram muitas, passou de tudo um pouco da cabeça dela: poderia ele ter se arrependido, mandado a mensagem por engano (era pra outra pessoa) ou qualquer coisa do tipo. Talvez estivesse apenas muito ocupado para lidar com as suas próprias emoções e precisasse de um tempo pra si.

Enquanto ela permanecia ali, lidando com a ausência dele, sentia ainda a onda intensa de calor que ele havia lançado sobre seu corpo e sua mente. Em meio a reviravoltas, ele continuava a ser a única pessoa que a fazia sentir-se assim. E sabia muito bem que ela era completamente louca por ele, mas que assim como ele, também fugia, temendo o confronto consigo mesma.

Passada a empolgação, ela voltou a ponderar sobre a mensagem recebida dias atrás. E, por não querer correr riscos, procurou não se deixar levar mais pela expressão em demasia e seguiu com a vida, aceitando a provável simplicidade da frase. Concluiu que ao invés de tentar encontrar significados, o melhor seria apenas aceitar logo o óbvio, ficando apenas com essa interpretação literal: era tesão e pronto, nada além disso. Manteve os pés no chão, por medo de que, ao se abrir demais, acabasse se machucando.

Afinal, a considerar apenas o seu sentido puro, a frase já era ótima e mesmo que ela sentisse ou quisesse que fosse mais, a verdade poderia ser bem direta.

No fundo, juntos, além de dois amantes, eram dois incompetentes amorosos, sem saber como fazer o amor funcionar. Levando em conta a não convencionalidade em que tudo acontecia entre eles, isso era natural, era o que ironicamente fazia dar certo. Encontraram uma forma de conexão que orquestravam no momento.

Era o jeito peculiar como aprendiam, a passos lentos, sobre si mesmos e sobre o oceano caótico em que estavam. Se algum dia conseguissem sair disso, poderiam enxergar o quão simples e leve poderia ser a vida livre dessas complicações. Sendo o tesão literal, visceral um do outro, sendo todas as formas de tesão que poderiam ser conhecidas ou criadas por eles, tantas, que nem mesmo caberiam em uma só vida.