Toda Oscilação Conta

Dor no peito, aquela maldita dor no peito que a segue a dias. A sensação da angústia multifacetada proporcionada pelo desgaste mental que vem da rolagem de uma fita quebrada, que rebobina sempre os mesmos pensamentos, e verdades moldadas apenas pelos sussurros acabam por ecoar em sua mente. Enquanto seus olhos ardem e sua pele coça, Amanda sente o borbulhar se seu suco gástrico digerindo o sanduíche de mortadela barata que, mesmo sabendo que não deveria, comera mais cedo, por tédio e impulso; Ao mesmo tempo sente uma dor pontuda oscilante em seu intestino delgado, que acompanha o pulsar de seu coração. Amanda agarra-se na ideia fixa de que irá morrer em algumas horas, instantes até, sem motivo aparente a não ser as pistas duvidosas que seu corpo tanto produz, quanto interpreta, em um ciclo vicioso de auto-sabotagem que a consome a mais tempo do que pode lembrar.

Amanda gosta de pensar que a mente humana é projetada tal qual um polígono tridimensional formado por paredes altas, sem teto e com um centro de controle no meio. As paredes são painéis que projetam cuidadosamente cada aspecto da vida a ser analisado, interligado e relacionado, podendo aumentar em quantidade em função do desenvolvimento e da idade que proporcionam ao ser certa maturidade; Contudo estas mesmas paredes dependem intrinsecamente da profundidade do indivíduo, fazendo com que o polígono varie em complexidade com base na percepção e compreensão geral da pessoa, de modo que existam triângulos, quadrados, pentágonos, heptágonos e mais e mais formas que tornem a manutenção mental de cada um mais pacífica, respeitando suas limitações.

Contudo, Amanda vê-se cada vez mais sufocada por seu polígono, que, apesar de quando criança ser semelhante a um triângulo, hoje aproxima-se mais de um dodecágono; Existem muitas paredes, muitas informações, percepções, que arrastam-na vagarosamente à exaustão; Tudo parece borbulhar, não só seu estômago, enquanto amanda torna-se autoconsciente o suficiente para sentir os níveis de oxigênio em seu sangue, para sentir o suor saindo de seus poros; São tantos lados que a consciência no centro de controle, nem se possuísse oito pares de olhos seria capaz de observar de maneira precisa.

Mas há momentos onde tudo isso se dissolve, e a garota não sabe se é uma benção ou uma maldição. Seu polígono mental se apaga e se reconstrói como uma sala de espelhos, onde as paredes refletem sempre a mesma coletânea de pensamentos, raios luminosos incandescentes que fazem ecoar sempre os mesmos sussurros soprados, a cada reflexo disparado uma onda de impulsos, que descem de seu cérebro e caminham apressados por suas terminações nervosas, corrompendo seus órgãos e seus membros, tudo fica sensível, tudo explode.

Enquanto tal alegoria acontece de forma biológica no organismo de Amanda, todos os seus sentidos se acentuam, e ela se sobrecarrega de estímulos internos e externos; Inspire, expire, inspire, expire, lembre de respirar. Amanda dorme e acorda dominada por sua mente; Quando dorme, demora para pegar no sono e dorme muito pouco, quando acorda, suspira, respira, respirar? Inspire, expire, inspire, expire

O cansaço é corroente, mesmo estando contido por horas, dias meses, em algum momento ele sempre a domina, desmonta tudo a sua volta. São cinco horas da tarde, mas Amanda não se importa. Deitada no chão, puro, duro e frio, ela permanece por exatos quarenta minutos e trinta e sete segundos, não se mexe nem se move enquanto sangra lágrimas doídas que escorrem pelo seu rosto gélido, sem expressão. Não consegue se mover, é impossível; Seus músculos, que costumam ser tão fortes, agora tão fracos, travam e enrijecem, configurando seu corpo estirado, tal qual um objeto inanimado e irrelevante.
Para Amanda, toda mudança em seu corpo é um alerta, sinal de perigo, que a desregula e a cega; Não existe mais nada, só a vida, só a morte; E para Amanda toda diferença de sensação é relevante, é tudo um passo mais perto do fim caminho, Toda Oscilação Conta.