Brisas de um suposto amanhã.
Eu cá estou, a ver o meu tempo se esvair,
Eis que tratei o tempo com indiferença
E ele me retribui com seu descaso.
Assim, é que envelheço, ainda vivo em mim.
Eis que quem viveu por metas e propósitos,
De repente se encontra frente
Ao desafio de elaborar o próprio fim.
Como se isto fosse possível!
Mas como não se deixar levar pela ilusão de controle,
Como não saber que a esperança tem limite,
E que só não terá limite, se houver um além.
Não me faltam perspectivas, não me faltam hipóteses,
Minha razão sempre conviveu com a fé,
A minha fé nunca foi crença,
Hoje percebo que é ela que faz minha razão ir além,
Não se trata de se justificar para este ou aquele,
Mas para comigo, deve ser a tal consciência.
Eis que tenho minha ‘solidão de mim’ preservada
Em que pese meu apreço e gosto pelo gregário.
Não escrevo para o outro,
Embora minhas letras parecem querer dialogar,
Transformar minha autorreflexão em algo compartilhado.
E nisto encontro uma certa graça em viver,
Eis que a vida me permite pensar de forma razoável sobre o seu fim.
E não sei sê, isto é, dádiva ou maldição,
Mas não consigo deixar de avaliar,
E sendo possuidor de coisas, sei que não mais as terei,
Sei que ao fim, em havendo algo,
É o que trago dentro de mim.
E como descrever isto?
Como encontrar um significado temporal?
E então, elevo um brinde de água pura aos céus,
E de modo lúdico, deixo as palavras fruírem,
Busco um sentir para poder significar
E tudo que encontro
É uma espécie da saudade do futuro,
Que só sinto,
Mas não consigo compreender
Na lúcida loucura de mim.
Gilberto Brandão Marcon
18/03/2023
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