Perdido no Berço do Universo

Perdido no Berço do Universo

 

O tempo passa,

O homem que há em mim morre a cada dia,                               

E parece renascer algo que suponho ser meu espírito,

Fico mais próximo do que julgo ser minha alma.

Não tenho certeza de nada,

Sou tão cético como impregnado de profunda fé.

Já não busco explicações, pois há exaustão da existência.

Deve ter ocorrido uma gênese em que surgi dentre tantos,

Mas é obscuro o lugar a que poderemos chegar.

Sou único, somos únicos e ainda assim temos algo em comum

Não conseguimos comungar e dividir o pão da vida.

Entre o pouco de luz que temos e o obscuro que está em nós,

Somos mesquinhos demais para atingir um além de ser.

Nada esclareço, nada quero, apenas divago.

Divago para sobreviver o homem e para não matar o espírito.

Não tenho resposta, apenas umas tantas perguntas,

Pois que para cada interrogação surgirá um novo interrogar,

Neste tolo mundo de tantas exclamações.

Não sei se existe um caminho, pois que vago perdido,

E é não achando que parece que vou encontrando as partes de mim.

O tempo passa,

O tempo já passou,

Haverá de passar,

O tempo, sempre o tempo.

Cigano migrante neste caminho que parece não ter fim,

Me faz temer a eternidade,

Não por temer castigo ou coisa parecida,

Mas por ter a possibilidade de ser eterno.

No falecer parcial de cada dia pareço

Cada vez mais apreciar o gosto da efemeridade,

A possibilidade de uma finitude ante ao caos que tudo é.

Sim, um caos acobertado por uma ordem superficial.

Mero véu que cobre os olhos que pensam ver,

Quando é apenas o coração que consegue ter o dom da visão.

Tantas páginas escritas, tantas vidas idas, tantos exemplos,

E a justiça não está com os justos, e amor não estão com os santos.

Tudo é vilipendiado,

Tudo é um punhado de pó que se pensa possuidor da Terra.

E até mesmo a verdade, ainda que relativa, pois que sincera,

É mastigada e regurgitada pela boca dos muitos hipócritas.

Eis que tenho autojulgamento, tenho alguma noção,

Aqui vejo palavras duras, mas que não têm espinhos,

São como botões de flores selvagens,

São vorazes em franqueza.

Mas tudo tem seu tempo, e novamente o tempo

E ouço uma velha canção ‘Le it be’, e me livro de mim,

Me ajoelho com o corpo, mas meu espírito está ereto,

Minha alma viril parece se encantar com uma presença feminina,

Pois no feminino está o encanto que faz o masculino se realizar

Tal como no masculino o feminino aguarda algum tipo de promessa oculta,

E eu que cada vez mais sinto no declinar do corpo o cansaço que pede descanso,

Respiro por um momento,

Mergulho em algumas lágrimas que não chorei,

Pois não as quis, mas elas quiseram lavar meu coração,

E então eis que traduzo a canção,

Uma espécie de lamento: ‘deixa estar’.

Com carinho beijo as mãos de uma figura materna,

E numa despedida que parece me prometer um encontro marcado,

Me suponho perder a razão,

Mas me percebo completamente lúcido.

E por agora, encerro, em letras que pedem silêncio

Sinto ecoar em algum céu noturno que a tudo revela uma poesia

Que se transforma em oração, sinto uma estranha alegria.

Vejo uma espécie de jardim do éden,

Não me iluso, mas me encanto com a miragem do deserto.

Deserto da vida, deserto da existência,

Árido lugar construído pela humanidade de cada um.

Então, deixa estar, deixa estar....

 

13/08/2022

 

Gilberto Brandão Marcon