Ponte para o Infinito

Ponte para o Infinito

 

Numa fuga ao encontro de si.

Distante de meu próprio sujeito,

Numa ponte perdida do espaço e do tempo,

Não me vendo entre o cotidiano e o profano,

Nem ajustado ao idealismo da razão

Ou ao sagrado da fé.

Apenas eu e minha solidão com o Todo,

Minúscula parte que se sente no limite do nada,

Mas que a consciência insiste e se fazer presente,

Que mergulha na interioridade,

Mas é acordado pelos olhares dos outros.

Neste ir de passos que apenas significam movimento,

Olho para o presente, e eis que já existe tanto passado,

Quantas partes de mim já deixei por lá,

Ah, estas significativas memórias,

Longe de pensá-las uma realidade,

Sei que têm as cores dos meus próprios valores.

Eis que o futuro me convida para atingir o fim,

Pois que por mais dourado que seja, haverá um fim.

Ah, e como angústia este ponto final!

Não por entender que tudo de certa forma acaba.

E como única resposta da razão a tal constatação,

Uma contraposição dialética entre a finitude e a eternidade.

Não descreio, pois é a fé

Que me guia a ir além da razão ainda tão limitada.

Eis que o Propósito não tem corpo, não tem nome,

O Propósito está muito além de minha razão,

Mas tenho uma sensação de que meu coração o sente.

Mas não me cabe proselitismo,

Não me cabe nada defender,

Eu apenas busco e tento algo entender,

Num contínuo confronto do corpo

E do que suponho ser minha alma.

De algum modo, em meio a minha prisão de tempo,

Consigo ter momentos de plena liberdade.

Mas é liberdade distante do conceito dito.

Pois não está posta, não foi concebida,

Não sei nem mesmo se está por nascer.

Apenas um talvez,  

Estar em algum lugar onde habita as distantes utopias.

E ao ler, haverá alguém de perguntar:

Qual é a utilidade disto? Ah, sempre as utilidades!

Quanto não haverá por se descobrir

No supostamente inútil?

Não se oculta ali o que seria fácil aos sentidos?

Então, eis que seria a proposta a paranoia?

Não! Pois que a solidão não é buscada para ser solitário.

Mas a impressão é que somente quem sabe ser solitário,

Parece andar pelo vale das sombras,

Ainda assim acreditando haver uma luz além.

Então que os solitários se encontrem,

Pois que em sendo únicos,

Saberão que a graça está no compartilhar,

Que a realização das partes só se faz no Todo.

Eis que revejo a ponte,

Antes oculta em nevoeiro psíquico.

Vejo seus dois lados,

Minha vontade é não estar nenhum destes lugares,

E talvez nem mesmo queira estar nesta ponte.

Mas seria loucura, é preciso sonhar com os pés no chão.

É preciso fazer o vinho se converter em água pura,

E ao pleitear este milagre às avessas,

Poderão se rir do que aqui escreve.

Mas quem tem realmente sede,

Só a sacia com a água da origem.

Eis o que busco,

Que sei difícil ou impossível encontrar,

Mas eis que é onde sinto minha plena lucidez,

Ainda que esteja tão próxima a loucura.

Então respiro fundo, fujo de mim,

Para me encontrar face a face

Num espelho em que a alma desvenda o corpo.

E não me move mais a curiosidade,

Mas é como se o sentido da existência

Estivesse no destino do movimento.

E eu que tanto aprecio o controle,

Rio-o, de minha necessária ilusão.

É preciso ter disciplina para poder

Nascer, viver e morrer.

E além disto, acho que pouco sei.

 

Gilberto Brandão Marcon

24/07/2022