Um menino caminha.
 
Em suas negras mãos
carrega uma semente
negra.
Semente negra
para ser semeada
como se semeia a lua
como se semeia o sol.
 
É na terra vermelha
que a semente negra
cai
floresce
e renasce.
 
Renasce a semente
dos que deram voltas
ao redor dos baobás
dos que se jogaram ao mar
dos que sobreviveram à salgada travessia
dos que marcaram com suor o chão das lavouras
e com sangue o tronco.
 
Renasce a semente
Dos que protegeram suas crias junto ao peito
dos que tiveram as crias arrancadas dos braços
dos que tiveram os gritos abafados
e os cantos silenciados.
 
Renasce a semente
dos que foram calados por amargas balas
dos esquecidos nos quartos de despejo
dos injustiçados,
arrastados pelas ruas.
 
Renasce a semente
dos que fazem existência resistência.
 
Eis que, repentinamente,
o menino para.
Suas negras mãos estão envelhecidas
- Já não é um menino
e a negra semente
se fez
raiz.