Vejo no retrato da infância o que hoje não sou,
o que eu quis não pude ter, o que não queria
hoje mora no recôncavo  íntimo do meu ser.
 
Ao contemplar-me noto: não sou o mesmo.
No fundo sei a razão do não reconhecimento:
é tudo culpa do espelho, sim, a culpa é dele,
pois quando o contemplo – mostra-me a amarga
e a doce direção – digo amarga porque o eu interior,
em vontade própria, jamais escolheria este caminho.
Digo doce já que toda vez em que escolho seguir os
seus conselhos tenho a satisfação como companhia.
 
Na verdade, para ser exato vou dizer o que penso:
Quando escolhi odiar, este
espelho, fez-me amar.
Quando em minha inquietação optei por paz
ele trouxe-me Afeganistão.
Trouxe-me turbulências quando pensei deixar a
minha frágil canoa seguir numa boa o calmo rio.
Inda assim, quando busquei euforia e agitação
deu-me o sertão inundado de luar - bom lugar -
 
Este espelho é a causa da peleja que há mim,
já que quando busco o meu próprio destino ele
faz-me menino embalado por doce canção.
 
Penso hoje seguir para o sul, ele certamente
indicará o norte – lugar onde mora a sorte –
 
Mesmo eu não sendo o mesmo – reconheço!
Embora eu queira ir embora reconheço que
devo tudo a este espelho por desfazer-me
sempre e por não dar-me o que tanto anseio.
 
Reconheço que é o meu real construtor e,
por essa razão, vou sempre olhar-me por ele.
Já que reflete a verdadeira verdade, a sincera
sinceridade e todo o conteúdo do meu coração:
puxarei o banquinho, sentar-me-ei com carinho
pra buscar sua opinião, recheada de reciprocidade
de mostrar-me a verdade do que essencialmente sou.

Ozeas Genaro
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