No Engenho do Perdão
Como o vento que toca o moinho, a mudar o curso das
águas, em encanto sua mente é levada, no engenho que ela
girava.
O suco da cana extraia, camponesa de olhos profundos, da
cor do fundo do lago, semelhante ao caldo tirado. No degustar
da garapa a beber, nos seus olhos tão musgos mirar, das
moléstias do sol que ameniza, ao ouvir sua voz a cantar;
- A vida é como o engenho de moinho, que amassa o grão
no seio da terra mãe tirado. E que depois de amassada farinha,
retribui na forma de pão, o alimento pra sua jornada. Assim sou
eu nesse engenho da vida, feito uma caiana amassada, que Três
vezes passo moendo, retirando o sustento de casa. No ranger do
moinho que gira, a farinha na roda de pedra; mamãezinha
socorre depressa, sua filhinha presa na pedra. Sem as pernas
sobrevivi, com a força nos braços girar, este engenho de vida que
bebes, para tua jornada animar.
- Ó doce caldo amargo, deste engenho de cana a beber,
nesta torre perdi a esperança pelas minhas tristes lembranças,
de um passado que não consigo esquecer.
- Quem és tu viandante amigo, que na torre não quer mais
entrar, que destino tu trazes no peito, desta vida de moinho a
girar?
- Sou peregrino preso na roda, um bagaço amassado de
cana, sou amargo em fel de absinto, sem sandálias perdidas nos
trilhos. Mas bebendo este doce de engenho, dos teus lábios
solfejos que emana, conquistastes essa rosa vermelha; o penhor
da minha alma que canta.
- Tu és o jardineiro das flores, esta caixa tenho que lhe
entregar, a pedido de uma amiga, que ficou a me observar. Ela
disse que alguém me daria uma rosa vermelha como penhor,
fruto de sua maior riqueza, em amarras de um grande amor. Este
então seria o sinal para também poder lhe dizer; que ela ainda o
veria, sobre os trilhos da vida a vencer.
De alegria um sorriso ele deu, no abrir de sua caixa a pular,
um boneco de molas jogando; mil confetes perdidos no ar. Bem
no fundo um poema havia, rabiscado em um papel de pão, que
deixaram seus olhos em lágrimas, ao lembrar-se daquela
estação:
- Camponesa sem pernas que andava, com os braços
chamado perdão, no engenho da vida cresceu, aprendendo a sua
canção. Assim devemos nos perdoar, dos fantasmas que nos
permeiam no ar, de nossas culpas que acreditamos e que nos
fazem aleijados ficar.
Então ele compreendeu, que aquele seria seu terceiro dia
de cura sob uma recuperação, ao ver seus fantasmas partir, por
um simples papel de pão.
No escuro da noite sem lua, ao profundo sono da
madrugada, em crescente luar uma espera, lua nova brilha na
enseada. Na estação muitas flores havia, o jardim que mudou de
lugar, aguardando o apito do trem, lua cheia pra rosa voltar
O ENCONTRO
Lágrimas que caem ao chão, sem as flores para amparar,
pelo tempo que foi se passando, a fazer suas pétalas murchar.
Seu olhar no cume da montanha, a fumaça não quer se mostrar,
do apito de um trem que não chega, sem os trilhos a descarrilar.
De paixão sucumbiu o luar, em eclipse com o sol a brilhar,
tendo como platéia as estrelas, de uma noite que não quer mais
passar. Não há mais flores em seu jardim de amores, nem mais
bonecos de molas a pular, de um vagão que não sai de sua
mente, sem saber quando ela vai regressar.
Forjado no calor das emoções, incessante bigorna a sofrer,
retinindo nos trilhos da aldeia, férrea linha locomotiva a trazer.
De jardineiro a ferreiro se fez, derretendo o ferro a moldar,
no suor escorrendo do rosto, trilhos novos pro trem desfilar.
- Minhas rosas enferrujaram, solidão quer de novo
envolver, no calor que suporto em minha alma, das angustias do
quarto escuro a temer.
- Negras nuvens que cobrem o luar, desta aldeia sobre todo
o meu ser, que destino terá a minha alma, como posso sem ela
sobreviver?
- No vazio ilhado que invade, singular sentimento no
coração, não há flores em minha jornada, somente pétalas de
separação.
- Que os céus goteje esperança, em meus ombros
queimados de dor, pelos trilhos pesados que levo, ao encontro
de tamanho amor.
No caminho de um sol escaldante, de conflitos no deserto
da vida, sucumbe a razão dos amantes, a provar a paixão
envolvida. Já prostrado pelo cansaço, no tombar de uma
imensidão, vulnerável desfalece em silêncio, sobre a sombra de
um velho vagão.
- Quem és tu que o deserto atravessa, em coragem e
determinação, que destino tu trazes na alma, nestes trilhos
envolto em solidão? Sua voz ecoava ao fundo, toda tremula ante
a situação, ao olhar que o menino dos trilhos; era o filho deixado
na estação.
- Fui forjado nos trilhos da vida, sob a sina de um triste
vagão, aprendendo em moinhos de trigo, melodia a falar de
perdão. Em meus ombros feridos carrego, um só elo pro vagão
andar, pelos trilhos rompidos na alma, de um amor descarrilado
a buscar.
- Sua voz soa familiar, no apitar do apito do trem, melodia
suave aos ouvidos, em lembranças de um passado de alem.
Cicatrizes carrego comigo, de abandono de muito castigo,
orfanatos de solidão, em um quarto escuro escondido, no vazio
de um vagão.
- Quem és tu ermitão do deserto, qual o conto trazes no
coração, o que fazes no vácuo perdido, na carcaça deste velho
vagão?
- Sou a dor da saudade que bate, cada dia dentro deste
vagão, consumindo a minha alma em angustias, estilhaços de
separação.
- Ao redor de uma mesa ceava, a família no repartir do pão,
de mãos dadas agradecíamos com o coração cheio de gratidão.
Porem sobre aquela aldeia, pairava uma nuvem sombria,
agressiva epidemia avassaladora a dizimar. Ceifando a vida no
campo, derradeiros rastros em pranto, de lágrimas a contaminar.
- A fome foi chamada na terra, a morte passou a reinar,
cada casa, cada família, triste peste a alastrar. O luto estampado
no rosto, de um olhar tão perdido em desgosto, ao sentir o
cheiro nas portas, da doença minha casa entrar.
- Nas perjuras de amor que fizemos, minha amada e eu a
chorar, com o fruto do amor protegendo pro menino não
contaminar.
- A aldeia obrigava a embarcar, no apito do trem a levar,
todo aquele que a praga pegava, pro deserto errante vagar.
Quão dura foi a decisão, pro filhinho não se contagiar, minha
amada e eu decidimos, pra criança então sobreviver; na estação
com o boneco de molas, brincaríamos de pique esconder.
- Mas os trilhos marcaram o destino, no ultimo apito do
trem, assustado o menino gritou, coração de mãe desesperou,
ao encontro do choro enxugar...
Um profundo suspiro na alma, interrompe o desfecho de
dor, no silêncio do vácuo perdido, pai e filho no quarto escuro
escondido, entre lágrimas perdidas nos trilhos, das lembranças
de um grande amor.
Restaurado Pelo

alex
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