Subproduto de uma sociedade ilhada

 Homens invisíveis
Adornam as paisagens
Incomodam quem não quer ser incomodado
Em cores isso é mostrado
Mentes em preto e branco assistem
Cegueira de nascença ou de propósito
Nesse contexto alviverde
 
Em que devem mesmo se esconder
Pois o turista chegou
Por que devem se esconder?
Já que ele não vai os ver
Porque além de olhos, ele tem visão normal
Essa invisibilidade também é governamental
Camuflar é mais fácil do que resolver
 
Eles incomodam por atenção e esperança
São esquecidos, famintos e desiludidos
Subproduto da riqueza, um ponto material
Que o mundo vê, mas não enxerga
A imagem é formada antes da retina
Os olhos dele uma lança de ouro abacina
Isso já é humano e cultural
 
Enxergado e ignorado
Rezando por um bico
Para pagar à biqueira
Ópio são o remédio e a morfina
Contra essa realidade que desatina
Criando uma expectativa
De se ascender ou apagar um dia
 
Toda essa insignificância gera incômodo
O incomodado que se mude
Pois eles não têm para onde se mudar
Não têm o que mudar, condenados à liberdade
Embora a vida tire sua utilidade
Pagando a dívida alheia
Seus pratos são vazios, e a barriga dos homens cheia
 
Meninos também invisíveis
Hereditariedade social
Não sabem pescar, então devem caçar
Selvagens contemporâneos
Sem instrução e sem moral
Por isso saqueiam os fartos conterrâneos
A fim de renascerem eupátridas visíveis
 
Enquanto vivem num pesadelo eterno
Seriam sinônimos Terra e inferno?
Tiro, sangue e risos (dos outros) e pranto
Na condição de semicoisa estão por enquanto
Quase coisa, apesar de já ser algo
Como o paradoxo de viver assim e ainda ser invisível
Seres na rua ou de rua?

Manoel Flávio Kanisky
© Todos os direitos reservados