NOITE DOS MORTOS("De Vozes do Aquém")


Não acredite em vida,

depois da morte.

 

Só há a morte

lá do outro lado.

 

Viva a vida onde há vida.

 

Não haverá lembranças e nem sinais,

apenas uma noite contínua e silenciosa.

 

A alma acaba.

 

Finda com a vida,

pois a ela é inerente.

 

O mundo dos mortos

não é como o nosso.

 

Não é nada,

apenas o que sobrou,

enquanto persiste o eco

daquilo

que eventualmente foi.

 


Não poderiam caber

todos

no mesmo Paraíso,

por isso já foi tudo criado

como é,

sem nenhuma esperança

de ser diferente.

 

Ser é um prêmio,

mas perceber, um castigo.

 

Antecipar o desfecho

pode parecer razoável,

mas também

inútil.

 

Não resta à Inteligência

senão permanecer

inerte,

ou seja

burra.

 

Força a consciência

a farsa.

 

E resulta em uma farpa,

doída.

 

Saudade não constrói.

 

Toca.

 

Pedra tapa,

mas não garante

que escape

o desejo.

 

Talvez supere a vontade

o limite

e traga

esperança

para quem tenha

ousadia.

 

Nada garante,

mas vale a pena

plantar

a semente

no solo

que os pés

consagram,

ao marcar com a pegada

onde antes

havia

somente pó.

 

Evito,

mas também insisto

em chamar.

 

Não ouço,

prefiro

manter as portas abertas.

 

Confesso

que acho

que não creio,

mas acalento

algo

frágil,

como o movimento

repetido

perto

da minha

sombra.

Nelson de Paula
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