Ah, minha pequena, como te esperei...
Quantas risadas tuas já me acordaram.
Quanto já te imaginei,
antes mesmo do dia que tuas mão me tocaram.
 
E ainda tão pequena.
E para sempre tua minha gratidão
por terem estado presentes, em cena
os meus olhos,  vendo pulsar teu coração.
 
Me lembro como hoje, como meu despertar
Como tatuagem, sonho nunca apagado
Ouço ainda teu primeiro choro me acalentar
Sabendo que minha menina havia chegado.
 
Vi teus olhinhos abrirem, filha
Ainda suja do nascer
Só não gritavas mais alto que a minha alegria
De poder ver, enfim, minha pequena vida florescer
 
Tomas-te meu ar com teu respiro,
nada mais me resta que não seja teu.
Tens à mão minha cabeça, braço e suspiro
és agora indispensável, fundamental ao meu eu.
 
Em cada pensamento que me ocorre
traçado todo o teu futuro em mente,
como querendo domar a sorte
não permitindo que o acaso experimente.
 
Mas o teu sorriso minha flor...
Teu olhinho me caçando a voz,
a risada banguela , o rubor
da bochecha, meu algoz:
 
Me lembras de ser só (nesta vida), passageiro.
A mãozinha que belisca meu rosto não mente:
Não controlo o que me é alheio
por mais que minha vontade tente.
 
Te carrego no colo hoje mocinha
já não tão tremulo, sem tanto medo.
Sem receio de machucar  a mãozinha
que se enchia, com a ponta do meu dedo.
 
Dormes agora tão tranqüila em teu berço
largada, espalhada, singular fragilidade.
Te vigio de perto, ainda não adormeço,
me permitas só mais este segundo, por caridade...
 
Já é tarde pequena, há muito o dia partiu.
Já findaram por hoje as brincadeiras,
sua Camila já se despediu
e mamãe Silvia já lhe deu a última mamadeira
 
O amanhã já vem, querida, aproveita a soneca...
Já já terás de volta tuas meninas!
Logo estarás em seu carrinho, com tua boneca
fazendo valer teus choro e manias.
 
Vovô e vovó prometeram vir à tarde,
Titia Jú sempre quer notícias, mesmo bem longe,
És amada, mimada, num verdadeiro alarde
Isto ninguém lhe esconde!
 
Mas esta noite, sou só eu o teu guardião.
À postos, velando tua história
em  sono de tranquila mansidão
colhendo paisagens , camafeu da memória
 
Insistes em se contorcer.
Hilária pose de anjo desleixada.
A chupeta perdida pelo adormecer:
motivo de choro na madrugada!
 
Estranha sensação, quase consolo
de se completar, ao se servir
de me saber feliz vassalo
por todos os dias que me hão de vir
 
Abriste rombo em meu peito, flor,
chegaste docemente em meu solo mais brando
fizeste tudo tão simples, fácil, sem dor,
enraizaste-te em ternura e acalanto
 
E logo mudarás, eu sei... andarás,
E isto faremos de mão dadas!
Correrás, brincarás... e onde quer que vás,
Estaremos juntos, por toda a estrada (prometo).
 
E haverá a escola, os amigos, boletins
E músicas e aulas de ballet
e estarei ao teu lado para coisas sem fim
 para também aprender como é que tudo é (prometo).
 
E vou lhe ajudar um pouco no inglês e nas lições.
E lhe cobrar se a nota precisar melhorar.
Vou dar bronca pelas mal criações,
e meu colo, sempre que precisar (prometo).
 
Mas isto tudo é só teu pai planejando mais do que deve, de novo,
Parando, por se lembrar o que fatalmente será dor;
Não assusta, eu às vezes choro mesmo como bobo:
o futuro vai te arrancar dos meus braços, meu amor.
 
Sei que tua vida seguirá em frente
e cedo demais (para mim) me soltarás a mão
e andarás sozinha , livre em mente.
Deverá seguir os rumos do seu coração.
 
Te  aventurarás por caminhos,  por trilhas
Onde eu não conseguirei lhe acompanhar
Encontrarás seus amores, escreverás suas poesias
E isto eu não saberei lhe ensinar.
 
A mim restará sempre a dádiva do teu primeiro sorriso
Por ti, minha eterna gratidão em louvor
A mim o temor em zelo pelo teu caminho, o perigo
Por ti, ensinar-me nova maneira de entender o amor.
 
Estarei sempre aqui Maria Clara, a teu alcance.
Meu colo sempre à tua disposição (prometo).
Firmo contrato, fato solene,
como avalista, meu coração.

 

 

Antonio Sabino Filho
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